Mais cedo ou mais tarde, em algum momento da vida, você descobrirá que é dispensável. Ninguém é insubstituível. É uma notícia dura, mas, convenhamos, necessária para os dias de hoje. Até porque, se você ainda acha que o mundo gira em torno do seu cargo ou de sua profissão, talvez esteja confuso e carente.
A síndrome da “carência de protagonismo”, descrita por Marcelo Duarte Lins com elegância comovente, é, antes de tudo, uma tragédia burguesa.
Digo tragédia no sentido mais clássico possível: a queda de uma personagem que, por hábito ou vaidade, acreditava-se maior que todos, colecionando subordinados, atribuindo a si grandes responsabilidades, fazendo reservas em restaurantes caros, tudo isso ilude e engana até que, de repente, descobre que seu WhatsApp não vibra e permanece por horas em silencio ensurdecedor, dando-lhe enfim a triste noção de que sua importância é meramente relativa. Só resta o grupo da família (com notificações mutadas, é claro).
O drama é íntimo, mas não raro. Ser ex qualquer coisa exige uma musculatura emocional que poucos possuem. Ex-presidente, ex-diretor, ex-artista da moda, ex-objeto de desejo, ex-dono do cachorro. Pior ainda: ex-escutado. Sim, porque o ex vira eco melancólico, que tenta em vão lembrar aos outros da própria insignificância.
Claro, sempre há os que reagem com altivez. Aposentam-se da função, mas não dá pose. Continuam a dar conselhos, interrompem almoços para contar histórias das quais são protagonistas absolutos. São os que se sentam nas rodas de conversa com o olhar perdido e a garganta pronta para tagarelar assuntos vazios. Afinal, o silêncio é uma forma de morte e eles, coitados, ainda querem viver.
A ironia, como se sabe, é que o anonimato pode ser um presente. Um privilégio. Almoçar sem pressa, passear com o cachorro, brincar com os netos. Agora é possível. Mas, como todo presente, só é útil para quem sabe recebê-lo. A maioria, infelizmente, quer devolve-lo.
Alguns empresários, políticos e personalidades, tem a ousadia de aceitar o papel de avô como “o melhor cargo que já exerceram”. Uma heresia para os que ainda medem o valor da vida por uma sala com ar-condicionado, uma caneta Mont Blanc e uma secretária eficiente. Talvez ele esteja certo. Há algo de profundamente revolucionário em abdicar da importância e continuar inteiro. A vida é uma m..., mas a gente descobre isso tarde demais, muitas vezes na ante-sala do funeral.
No fundo, a verdadeira medida de grandeza das coisas está em saber sair. E mais: em sair bem. Sem ranço, sem plateia, sem vitimismo. Apenas com a leveza de quem já foi e não precisa mais provar nada para ninguém. Porque os aplausos só duram até a próxima reunião. Depois disso, resta a solidão e o silêncio. E, se bem usado, ele pode ser a mais elegante das falas.
