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A babelização dos nossos medos

Pegue em minha mão. Vamos passear pelo noticiário destes dias aflitos. O assunto dominante é o conflito entre Israel e Palestina devido aos atos terroristas do grupo Hamas. Agora a pauta gira em torno de uma bomba que caiu sobre um hospital na faixa de Gaza matando mais de 500 pessoas. Todo mundo tem uma opinião sobre o assunto. Centenas de teorias coexistem e todos falam coisas que ancoram seu ponto de vista em algum porto seguro. Eles falam sempre apontando o dedo. Somos todos idiotas. Por causa dessa palavra demitiram um cara ontem no Governo Federal. Talvez o único e verdadeiro idiota dessa história.

Todo dia morre gente. Já são milhares: homens, mulheres, crianças. As imagem são de caos e destruição. Daqui a pouco nos acostumamos. 

Estamos lidando com muitas informações, muitos interesses estranhos, coisas submersas, disputas ferrenhas pelos nossos corações e mentes. Mesmo tudo acontecendo lá longe, no Oriente Médio, aqui no Brasil estamos brigando com nossos vizinhos, nossos irmãos, xingando uns e outros pelas redes sociais, políticos em conflito, uns querendo desgastar o Governo, outros querendo mostrar que são proprietários do patrimônio moral da consciência nacional, enfim, a exposição da complexidade da natureza humana em meio à selvageria das nossas verdades indissolúveis.

Só peço uma coisa: por favor, continue comigo, não solte minha mão. O dia é longo, a tarde é triste, e logo vai anoitecer antecipando o que virá no dia seguinte. Vamos juntos. Por mais que me esforce em compreender o conjunto da obra só consigo ver neste conflito uma monumental crise de humanidade. Não somente entre aqueles que estão lá vivendo todos os horrores da insanidade, mas também entre nós, que acompanhamos tudo como se fosse um filme de Godard, cujo roteiro é sobre uma tragédia inominável. 

É tudo muito confuso.

Sigamos adiante. As notícias boas são poucas. Há sempre uma brincadeira no tik tok que nos faz rir. Há sempre um meme que nos distrai. Há sempre uma tretra no Congresso Nacional a nos indignar. Sabemos que senadores e deputados continuam com suas nebulosas transações, alguém neste momento está roubando dinheiro público, existem pessoas desesperadas com a traição na casa de alguma celebridade, mas como dizia aquela música antiga o sol se reparte em crimes, espaçonaves, guerrilhas, em Cardinales bonitas, e assim vamos, acreditando que o futuro continuará a ser um paraíso inalcançável.

Por isso, só lhe peço que continue ao meu lado, só mais um pouquinho. Não me largue no meio do caminho. Hoje em dia ninguém gosta de ler. Mas tem tanta coisa louca acontecendo no mundo das palavras que só posso dizer: se você me abandonar ficarei com muito medo.

Tem muito barulho acontecendo. Parece que estamos numa balada balalaica com tiros pipocando e corpos caindo. Esse barulho é tão forte.Está faltando um pouco de silêncio e precisamos de contemplação que não seja só ficar olhando fixamente para o celular. Tem coisa esquisita acontecendo. Por isso quero lhe dar um conselho: vamos fugir. Sim, vamos sumir.

A invasão dos bárbaros já começou. E o pior é que ainda não temos para onde ir.




PS - Nesta semana publiquei um comentário sobre uma reportagem da Revista Piauí que traça um perfil otimista de Simone Tebet, por ora Ministra do Planejamento. Vários amigos reclamaram. Uns de maneira veemente; outros, com mais doçura, embora em tom de reprimenda. Como tenho respeito por eles, alguns inclusive tenho relações fraternas, apenas respondi que críticas são saudáveis num ambiente que cada vez mais tenta suprimir o contraditório. Não tenho nada contra Simone. Ela nem sabe que eu existo. E, com certeza, deve ter outros problemas mais importantes com que se preocupar. Espero não encontrá-la nunca. A única vez que isso aconteceu foi decepcionante. Achei-a desumana e desrespeitosa. Me pareceu uma pessoa que se considera acima do bem e do mal. Sua energia é ruim. Que viva sempre junta e  misturada com os Renans Calheiros da vida.