Poema de Dante Filho
Penduraremos os paletós
Enforcaremos as gravatas
Nos sagraremos no asfalto
(Com o beijo da morte)
E vestiremos a vida
Abandonaremos nossos corpos aos poucos pelas calçadas
Sorriremos, choraremos, arremessaremos nossos punhos
num gesto inútil suspenso no ar
(como o ato derradeiro antes da celebração da loucura)
Gritaremos no eco para que a nossa voz
reverbere nas vozes perdidas
E repercuta na tênue teia do espaço invisível das ruas
as palavras do silêncio:
enadavaleránadaenadavoaránonadaenadaseránada
E continuaremos a manter o nosso olhar no futuro.
Esqueceremos o nexo causal
a calda nasal
as asas do avião supersônico
E todos os odores das ciências.
E continuaremos fingindo um sonambulismo teatral
(para horror dos homens de letras e da economia)
Deixaremos para trás os pudores, as indignações e os gases letais.
Faremos da nossa vontade a razão insana de se perder por ai.
E seremos finalmente o maior espetáculo sobre a face da terra.