O oráculo do pantanal: coisas do poder
Os governos, na maioria dos casos, são óbvios. No caso da República de Maracaju, nem é preciso explicar em detalhes qualquer fenomenologia que atualmente faz muita gente dizer "Oh!, eu jamais imaginei que pudesse ser assim...".
Em junho de 2015 consultei meus oráculos no alto da serra da Bodoquena e exortei: "Que a natureza me dê o vislumbre sobre o nosso futuro!". Senti uma brisa leve e depois os trovões da risada.
Dito e feito: escrevi em seguida um artigo explicando o que ia acontecer com a administração tucana.
Em respeito aos meus amigos e leitores, reproduzo-o aqui para a avaliação geral. É fácil ser profeta de fatos consumador. Mas só a experiência e o conhecimento da alma humana possibilitam adivinhar o desastre com algum tempo de antecedência. Vamos a ele:
"Meu amigo e mestre Flávio Teixeira, um dos jornalistas que melhor conhece o funcionamento da máquina pública de Mato Grosso do Sul, contou-me certa vez uma historieta emblemática sobre a chegada de um novo governo ( qualquer um) ao Poder.
Segundo ele, há quatro fases que são seguidas à risca na inauguração da chamada “nova fase administrativa”.
A primeira é a da euforia, dos planos mirabolantes em torno de reformas estruturais, dos projetos sensacionais, das metas e dos sonhos a serem vendidos à população como verdadeiros apanágios do sucesso redentor. Tudo é festa: novos secretários, nomeações à larga, disputas internas para ver quem é mais preparado e competente.
Nessas horas há motivação de sobra, entusiasmo, o famoso “tamo junto”, “vamos fazer e acontecer”. Frases de efeito como “valorização do servidor”, “meritocracia acima de tudo”, “construção de novo futuro” etc etc etc ganham ares de verdade bíblica.
A mídia registra tudo, sem qualquer objeção crítica, seguindo a onda de otimismo porque, afinal, nessas horas pessimismo é coisa de perdedor.
Na segunda fase, coisa de 12 meses depois, o discurso eufórico cede espaço para a moderação e o realismo. Você já encontra secretários e assessores reclamando pelos cantos: “puxa, a coisa não era bem o que pensávamos”; “se não fosse a herança maldita tudo daria certo”, “sonhamos alto demais”, enfim, muxoxos de quem começa a colocar os pés no mundo real e perceber que a máquina pública é um complexo orgânico ensimesmado, completamente dominado pelo corporativismo, imune a qualquer motivação com quem ocupa momentaneamente o poder.
Vem em seguida a terceira fase, lá pelo final do terceiro ano de governo: a do derrotismo evidente. E, com isso, pouco a pouco, o ambiente vai ficando tenso, e os mais raivosos começam, então, a reclamar dos males da burocracia excessiva, da centralização dos poderes na União, das dificuldades de articulação com o Legislativo e Judiciário; da falta de colaboração e desinteresse dos chamados “funcionários concursados”(imunes à pressão das demissões políticas); das mumunhas e do extenso jogo de interesse capilarizado por todas as esferas funcionais.
Os nervos ficam à flor da pele. Nessa fase, muitos se perderam pelo meio do caminho porque pisaram na bola, não apresentaram resultados, jogaram a toalha, foram engolidos “pelo sistema”, ou decidiram simplesmente “fazer oposição”. Ou seja: a história vai se repetindo, ora como farsa, ora como comédia, às vezes como tragédia.
Daí vem a quarta e última fase: a da apuração das culpas e responsabilidades. Quem foram os traidores, quem sacaneou quem, quem boicotou as grandes idéias de gestão, quem foi responsável por esse ou aquele escândalo, “a imprensa é golpista”, “as indicações políticas foram um desastre”, enfim, reclamações furiosas, desespero total.
Em meio a esse frenesi, depois de muito burburinho, reuniões cansativas, levantamentos exaustivos, relatórios volumosos, planilhas de custeio, consultorias delirantes, surge, enfim, a solução luminosa para todos os males. O governador dá um soco na mesa e ordena: “vamos fazer uma reforma administrativa e punir os inocentes!”. "
PS- Esse artigo foi publicado originalmente em junho de 2015 no jornal O Estado de Mato Grosso do Sul.