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Alexsandro Nogueira: A solidão dos leitores

 


O escritor israelense Amos Oz, autor do clássico "Caixa Preta", costumava dizer em palestras que os livros não estão mais nas estantes ou nas cabeceiras das camas.

Tornaram-se uma paixão solitária, um prazer quase clandestino em meio a um mundo dominado por telas, estímulos rápidos e outros tipos de distração.

Ele não estava fazendo drama. Estava sendo realista.

Oz lembrava que a literatura viveu seu auge entre o século XVIII e o século XX, sobretudo graças às mulheres, que, confinadas ao espaço doméstico, fizeram da leitura um refúgio e um caminho para o mundo da imaginação.

Nunca se leu tanto quanto naquela época. Mas esse ciclo parece ter chegado ao fim. Para ele, o ser humano perdeu o prazer pelas coisas singelas da vida e os livros voltarão a ser o que foram antes desse período: um hábito restrito a uma minoria que simplesmente não consegue viver sem o farfalhar das páginas

Hoje, é a vez das telas. As pessoas vivem coladas a celulares, viciadas em redes sociais, consumindo frases curtas, vídeos de 15 segundos, fofoca sobre gente famosa e opiniões prontas.

Neste cenário, o livro é quase um corpo estranho. E, por isso mesmo, mais necessário do que nunca. A literatura, afinal, é uma das últimas experiências que exigem atenção, profundidade e uma pausa na vida áspera e competitiva.

É verdade que a escrita está longe de morrer. Nunca se escreveu tanto. Mas quase tudo é efêmero. Posts, comentários, slogans, desabafos — tudo somado a um ruído que mal conseguimos processar. A pergunta é: quem ainda lê com calma? Quem ainda consegue terminar um romance de 300 páginas sem ser interrompido por uma notificação qualquer?

A resposta é: são poucos, mas estes fazem a diferença. Oz descreve essa minoria como pessoas que não abrem mão do prazer de tocar um livro, dobrar suas páginas, marcar suas linhas favoritas, rabiscar no rodapé.

Um prazer físico, íntimo, insubstituível. Não se trata de saudosismo. Trata-se de saber que há experiências que a tecnologia ainda não conseguiu copiar, nem substituir.

A literatura vai sobreviver. Não como protagonista, mas como resistência. Vai continuar existindo para aqueles que ainda têm fome de sentido e não se contentam com a mediocridade do dia a dia. É possível que os livros voltem a ser raros, como eram antes. Mas continuarão sendo essenciais.

Porque enquanto houver gente capaz de se emocionar com um poema de T.S. Elliot, um personagem inesquecível de Ernest Hemingway ou uma história que nos ajuda a entender quem somos, a literatura continuará viva. Mesmo que para poucos.

Alexsandro Nogueira é jornalista, escritor e músico