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Alexsandro Nogueira - A era dos apelidos amargos: o carinho que se tornou ofensa

 



Ao contrário dos vergonhosos apelidos que marcaram personalidades na lista da Operação Lava-Jato, exalando o veneno de quem dava dinheiro a esses corruptos, é curioso observar como alguns codinomes, repletos de afeto e nostalgia, estão desaparecendo da nossa vida como a fumaça de uma bituca de cigarro acesa em um dia de vento.

Na música popular, esses nomes carinhosos eram como um assovio sutil que afagava os ouvidos. Tremendão, Sapoti, Marrom! Nada de negatividade. Pelo contrário, cada um trazia uma história e uma identificação calorosa que nos conectava aos artistas.


O presidente Getúlio Vargas, com seu olhar perspicaz, associou a voz da cantora Ângela Maria à doçura da fruta (Sapoti), gerando assim um apelido que se tornaria uma declaração de amor à artista.

Mas, se olharmos para o presente, o que vemos? Ninguém mais chama Alcione de Marrom, nem se lembram de Tremendão para descrever Erasmo Carlos. Os apelidos se tornaram relíquias de um passado que parece distante, como uma canção esquecida em um velho disco de vinil.


Nos campos de futebol, então, a situação é ainda mais triste. Pelé, Garrincha e Zico se tornaram fantasmas em meio a uma realidade onde chamamos os craques de Bruno Guimarães, Neymar Jr.e até Rodrygo (com ‘y’). E assim, a criatividade sumiu de vista.

O que aconteceu com a magia de nomes como Neneca, Biro-Biro, Cafuringa e Manga? A criatividade, que antes pulsava nas ruas e nos estádios, foi sufocada pelo politicamente correto, que, na verdade, parece um convite ao tédio.


A leveza das interações ficou para trás, e hoje apelidos são tratados como ofensas. Chamar alguém de Mussum, em homenagem ao icônico comediante, é considerado uma agressão verbal. Faço até uma previsão: em breve, referir-se ao presidente como Lula e à primeira-dama como Janja pode ser visto como um crime.de ódio.

É um paradoxo essa busca pela seriedade em um mundo que já foi tão festivo. Hoje, o apelido é algo deletério, lançado com raiva para ofender; o que deveria ser um símbolo de carinho agora é encarado como escárnio.

Onde foram parar as conexões que esses nomes geravam? O humor e a informalidade foram substituídos por uma rigidez que só traz melancolia. Estamos tão preocupados em não ofender que esquecemos de celebrar a vida e a alegria que esses codinomes proporcionavam.

Bons tempos em que os apelidos não machucavam!


Agora, chamar alguém de Pitoco pode gerar mais reações do que um escândalo político. Vivemos em um mundo em que até os sorrisos precisam de autorização prévia. Se continuarmos assim, logo teremos que nos referir a todos pelo número do CPF ou RG, só para garantir que ninguém se sinta ofendido!

Alexsandro Nogueira é jornalista, musico e escritor. Colaborador do Blog