Dante Filho
Na convenção do PSD que escolheu Marquinhos Trad e Viviane Orro, no último sábado, para serem candidatos a governador e vice de Mato Grosso do Sul, a festa aconteceu conforme o roteiro planejado pelos marqueteiros.
O ex-prefeito chorou e pediu perdão à sua esposa, Tatiana, e às suas filhas, num gesto cuja dramaturgia transformou-se no assunto mais comentado da cidade, embora ninguém tenha ouvido uma única palavra da ex-primeira dama, que se limitou a sorrir o tempo todo. Ou melhor: falou o que toda mulher traída fala, ou seja, palavras que não significam nada.
Toda essa litania pretendia reverter o escândalo de estupro, assédio sexual e aliciamento que vem atingindo não somente o ex-prefeito como também um empreiteiro e um delegado de polícia, transformando em vítimas de armação todos aqueles que sabem perfeitamente o que fizeram no verão passado.
O choro de Marquinhos pode até ter sido sincero. Homem não chora fácil. Homens só caem no choro em momentos de extrema angústia, desespero e medo. É bem possível que estes três sentimentos estivessem habitando a cabeça de Marquinhos diante de um quadro inesperado, fragilizando uma candidatura que prometia fazer a diferença na atual campanha.
Muitos apoiadores e apoiadoras podem ainda manter a crença de que o ex-prefeito vai provar sua relativa inocência ( já que confessou adultério, numa história esquisita em que ele mesmo preparou desde o final do ano passado na base do “vão dizer que fiz isso e aquilo”, quando ninguém havia tocado no assunto...), jurando que seus adversários aproveitaram-se maliciosamente de um deslize menor para produzir um fato espetacular.
É provável que essa crença termine se dissipando conforme o inquérito policial avançar e for revelando, pouco a pouco, que as verdadeiras vítimas são pessoas vulneráveis (muitas mães solteiras, sem perspectiva de vida) que acreditaram que, relacionando-se com poderosos, as portas de salvação de si e de suas famílias pobres e carentes estariam sendo abertas rumo a um futuro diferente.
Mesmo assim, considerei o gesto do prefeito de pedir perdão à esposa e filhas muito corajoso, deslocando um dilema público para a esfera da vida privada.
Mas ele cometeu, mais uma vez, um erro político crucial: devia pedir perdão às inúmeras vítimas que foram aliciadas pelo seu gabinete e depois entregues para pessoas inescrupulosas e violentas para serem usadas como objetos descartáveis.
Não se trata aqui de celebrar qualquer tipo de puritanismo tosco, descartando o fato de que mulheres jovens ou adultas podem dispor-se como bem entenderem, já que “pecado” (no conceito religioso do próprio ex-prefeito) consensual não é crime e a justiça dos homens não pune criminalmente o machismo muito menos o desejo masculino e feminino.
Marquinhos parece que ainda não entendeu que à medida que optou em se tornar uma persona pública ele concedeu à sociedade ( e à imprensa, de modo específico) o direito de escrutiná-lo de todas as formas. Talvez isso explique o fato de as denúncias acabem surgindo em época de campanha e não em outro momento.
É da natureza da democracia que homens e mulheres sejam testados nessa hora. O eleitorado tenta fazer boas escolhas, principalmente avaliando o caráter e os princípios morais que norteiam a conduta de seus candidatos e candidatas. Ninguém está preocupado em eleger um santo, e sim alguém que consegue gerir o Estado com bons projetos e saiba fazer a sincronia entre discurso e ação.
Fora disso, caímos na vala comum do populismo e da demagogia sórdida.
PS – Toda vez que abordo este assunto nas redes sociais, me pedem para falar sobre o PIX enviado por alguém do governo para comprar o depoimento de supostas vítimas deste caso escabroso. Não duvido de nada. Mas quando peço os nomes de quem enviou e de quem recebeu o tal PIX, a resposta vem na forma de silêncio sepulcral. Não gosto de trabalhar informação com sujeito oculto.