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Precisamos falar sobre André

 

Puccinelli, assim como Lula, obteve salvo-conduto da Justiça e disputa legitimamente as eleições; não cabe mais jogadinhas de ultima hora.


Dante Filho*****

O ex-governador André Puccinelli é um político controverso, ambíguo, fruto das contradições de nosso tempo, herdeiro da linhagem do MDB de Wilson Barbosa Martins. Com André não existe meio termo: ou ama ou odeia. Mesmo assim, querendo ou não, ele faz parte da história de Mato Grosso do Sul. Não é possível dissociá-lo dos melhores tempos vividos pelo Estado. Os dados comprovam isso.

Querendo ou não, aceitando ou não, o fato é que seu nome ficará para sempre no nosso cotidiano. Aquele enclave arquitetônico nos altos da Avenida Afonso Pena está cravado como marca de outro Mato Grosso do Sul, dando-lhe perspectiva modernizadora. 

Todos sabem que o “Aquário Pantanal” será um monumento duradouro, mesmo que para sua viabilização e conclusão os nomes do governador Reinaldo Azambuja e de seu secretário de Infra-estrutura, Eduardo Riedel, figurem com destaque na placa inauguratória. Felizmente, todos deram demonstração de grandeza nesse processo.

Quando foi prefeito da Capital, André revolucionou a cidade, fazendo dela um centro urbano dinâmico, retraçando suas malhas viárias, implantando programas sociais, educacionais e habitacionais, estabelecendo assim marcos definitivos para que a cidade tivesse perspectiva de futuro. Ninguém tira isso dele. As pesquisas mostram isso.

Claro que existe outro André. Aquele que aprendemos a odiar, envolvido em escândalos, eclodidos num momento histórico do Brasil em que um presidente da república também conheceu a cadeia, além de deputados, senadores, empresários, todos enfileirados em cana dura, num dos momentos cruciais e dramáticos do fortalecimento das instituições de controle, numa espécie de repactuação federativa, no qual se acreditava que era fundamental fazer um corte oblíquo para extirpar de vez a câncer da corrupção. 

A sociedade e a mídia, lá atrás, clamavam por decência.O intenso desvio de finalidade dos recursos públicos encontrou uma barreira sólida, numa tentativa de desnaturalizar a cultura da corrupção estrutural no Brasil. Alguns pagaram o preço e outros buscam remissão. O eleitor dirá quem deve permanecer em punição e quem merece a absolvição. Puccinelli está pedindo que a sociedade o absolva. É legítimo e está dentro dos preceitos do Estado Democrático de Direito.

Ele, no plano estadual, e Lula, no nacional, obtiveram salvo-conduto do judiciário para disputar eleições. Tudo dentro da normalidade democrática.

A vida não é uma linha reta. Ela segue em espiral. Aquele quadro punitivo e persecutório de alguns anos está passando por intenso revisionismo. Exageraram na dose, e os efeitos colaterais tornaram-se piores que os resultados pretendidos. Juízes não são heróis nem santos. 

Não se sabe até hoje qual a origem do processo de polarização afetiva que estamos vivendo. Há teses de sobra por aí. Mas se sabe que sua intensificação deu-se entre a reeleição de Dilma, a Lava Jato (e as centenas de operações semelhantes) e a eleição de Bolsonaro. 

Nesse meio tempo, enfrentamos uma pandemia que produziu mudanças globais. As pessoas passaram a ser mais reflexivas, menos imediatistas, gerando aquilo que, num ensaio recente, descrevi como a “Era da Inadaptabilidade”. 

Paralelamente, começamos a enfrentar uma grave crise econômica (tornada mais aguda com a guerra entre Rússia e Ucrânia), que exigirá conhecimento, preparo administrativo, responsabilidade pública. Tudo aquilo que o populismo não gosta.

É neste contexto que analiso a atual campanha eleitoral de MS. Claro que os elementos da polarização (desinformação, fake news etc) estão aí no dia a dia, com seus grupos organizados, gente com gosto amargo de raiva na boca. 

A atual fase é a da maldade, todos querem destruir o inimigo. O Poder Judiciário é o instrumento punitivo. Existem os ingênuos que não perceberam o perigo que representa a Justiça ter se transformado em partido político. E há os maliciosos que se aproveitam da fumaça para enganar a população, querendo o retrocesso autoritário. 

Nos últimos dias, mais uma vez, o Partido do Judiciário está se movimentando. De repente, um jornal diz que a Justiça Federal fez “ressurgir” (o verbo é este?) a Operação Lama Asfáltica, envolvendo o ex-governador. Tudo pra causar falsas expectativas e mandar aviso cifrado a quem interessar possa.

 Penso que Puccinelli, neste atual contexto, não pode ser vítima de armação. É anti-democrático. Campanhas devem ser transparentes, sem jogadinhas de ocasião.

Acredito que não haja mais tempo para alterações institucionais da regra do jogo. Os eleitores conhecem os defeitos e as qualidades dos principais candidatos. Seus erros e acertos. Não há mais espaço para professores de deus e dedinhos em riste. 

O moralismo udenista está fora de moda. É fundamental que nos concentremos nas propostas de governo. Quais prioridades? Como será feita a alocação de recursos para saúde e educação? Quais projetos serão incentivados? Qual o pensamento macro de cada um para desenvolver o Estado? Quem tem programa a apresentar?

Basta isso para se fazer uma campanha civilizada, sem mentiras, sem dancinhas, sem gracinhas. O resto o eleitor decide.