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O sinal do futuro


Dante Filho - 

Tempos de incerteza:


Fico imaginando o cenário que vamos viver em setembro de 2022, na reta final da campanha eleitoral mais nervosa desde a fundação da Nova República. As libélulas de sempre estarão agitadas, acreditando que luzes acesas são a porta do paraíso, sem saber, lógico, que quanto mais quente, pior. 

Claro, tem gente que acredita em bola de cristal. Olha em frente e imagina que o futuro será mera repetição do passado. Ou pior: acredita que o presente se congela. Ou seja: que os dias se repetem indefinidamente, ou, mais engraçado, que a cada passo adiante ficamos apenas  no escuro, próximo do abismo. 

Não sei. Ou melhor: sei que não é assim, embora nos apeguemos à crença de que nos próximos 12 meses tudo confirme as previsões de hoje, sem muitas alterações, porque essa é a única maneira de nos sentirmos minimamente seguros diante das incertezas, da imprevisibilidade e das surpresas dos novos acontecimentos. 

Desenhamos nos céus crises, medos, caos, ao mesmo tempo em que somos advertidos da piora das coisas, mesmo sabendo que as nossas percepções sejam muito precárias para perceber as circunstâncias reais.

Nosso otimismo é sempre bombardeado com tintas fortes para acreditarmos no pior dos mundos, mesmo porque a natureza humana tem uma imensa dívida com o apocalipse, com a tragédia e com o deus-nos-acuda.

Lá na frente nos aguarda golpes políticos, conspirações tenebrosas, desemprego terrível, inflação incontrolável, recessão, fome, miséria crescente, enfim, coisas muito ruins e temerárias. 

Certeza? Essa é a questão. Muitas libélulas são categóricas: as coisas vão acontecer conforme o previsto, esquecendo-se apenas que o imponderável habita nossos dias tão turvados.

Os indicadores disponíveis dizem que o futuro está fechado. Quais indicadores? Aqueles divulgados pela imprensa com base em levantamentos do segundo trimestre, ou seja, num passado relativamente curto, embora a dinâmica do mundo real seja muito mais acelerada, não sendo possível mensurá-la no ponto exato dos momentos. 

Se eu fosse os coleguinhas tentaria pelo menos uma vez por semana imaginar como será o mundo nos próximos 12 meses. A eleição não será um passeio, com cartas marcadas como se deseja. 

Façamos um exercício de pular várias casinhas e depois olhar pra trás. Será que o que estamos pensando que os dados de hoje estará valendo na semana que vem? As digressões sobre política, economia, movimentos sociais, pesquisas eleitorais e comportamento institucional serão iguaizinhas?

Como se diz, haverá movimento das pedras. A própria dinâmica do processo induz a modificações constantes do jogo, a vida não é uma pedra, a carne humana é elástica, podendo se amoldar às suas circunstâncias imediatas. 

Devemos reconhecer que uma parcela privilegiada da sociedade consegue ter uma percepção sobre o andamento do jogo e antecipar ruídos e sinais. Capacidade de avaliação, intuição acurada, medo de não correr riscos, estofo para aprender com os erros - tudo isso pode ser somado para estabelecer um valor diferenciado quando a manada perde o rumo. 

Mas essas pessoas estão cautelosas. Sabem que o quadro atual será outro, mesmo porque a pandemia será provavelmente uma tênue lembrança e as expectativas serão diversas. 

Desde a década de 80, depois da ditadura, quando o Brasil passou a viver a permanente transitoriedade do poder que as mesmas libélulas ardentes se agitam antes da hora. O mundo mudou e elas permanecem as imutáveis. Não refletem, não se acalmam, não ponderam, e criam uma corrida maluca na cabeça, fazendo do ambiente uma realidade tóxica, acreditando,  que a polarização intensa nas redes terá a mesma força para fundar um outro País.

Não terá.