Pages

Alexsandro Nogueira: O homem guloseima


Na história da anatomia humana jamais existiu um homem com as dimensões genitais de Zé Marcone. O cara era exagerado. Às vezes, ele mesmo se espantava com o tamanho daquela coisa comprida, que mais parecia uma enguia.

Zé cresceu envaidecido pela anomalia e se valeu dessa particularidade para impressionar a mulherada. A primeira delas foi Claudinha, moça humilde, lá da Coophavilla, que de tão entusiasmada com as pinceladas do rapaz passou a descrevê-lo como ‘pé de mesa’ para as amigas.

Com tamanha propaganda vinda da periferia, Zé Marcone começou a fazer sucesso na região nobre da cidade: Jardim dos Estados, lugar onde conheceu uma paraguaia de coxas gorduchas, dando mole no pedaço.

Logo no início do romance, a mãe de Marcone se posicionou contra a relação. Indignada, ela dizia que aquela união não tinha cabimento e prevenia o casal  a respeito da imaturidade de ambos para um relacionamento sério. Depois foi a vez do pai do rapaz embaçar o romance e lançar olhares desdenhosos e críticas  severas sobre a paraguaia.

Até ali, tudo parecia conspirar contra o namoro, mas àquela altura, mesmo sem o respaldo da família,  nenhum apelo emocional fazia mais sentido. A relação estava consolidada desde que Marcone passou a pernoitar na casa da paraguaia.

Aqui faço um reparo: não se entende até hoje como um homem de esperteza sem tamanho foi fisgado daquela maneira e, pior, fazendo infeliz as mulheres que o tinham em rodízio.

O tempo passou e aos poucos a família foi digerindo a paraguaia, assimilando sua voz estridente, sua cara lambida, seus costumes gulosos e aquele jeitão preguiçoso da fronteira.

Dez anos depois, com dois filhos e uma rotina conjugal tediosa, Marcone não aguentou mais bancar o tipo marido fiel e passou a desfrutar da poligamia.

A coisa foi acontecendo naturalmente. Uma escapulida aqui, outra ali, até o cara  pôr os olhos em cima de uma colega de serviço.

A coisa começou devagarinho: conversinhas insinuantes, piscadinhas, convites para cervejinha e tira-gostos no pós-expediente, até Marcone arrastá-la desprevenida para a mesa do almoxarifado onde se amaram com fúria, fazendo estremecer até as divisórias do local.

No começo, ela fez jogo duro e aquele tipo de mulher reservada. Mas bastou o cara  aparecer no serviço se insinuando com uma roupa justa ao corpo e um volume grande empapuçando a região da braguilha, que a coisa mudou de figura.

Com a família de Zé Marcone oferecendo resistência e gastando-se em palavras contra o novo romance, o casal não teve outro jeito senão permanecer recluso na periferia. Não recebiam visitas, não atendiam  o telefone e saiam de casa só para trabalhar e tomar umas biritas.

Com salários atrasados e uma situação financeira difícil, Marcone e a nova mulher resolveram buscar uma saída para manter as contas da casa em dia. A ideia era arrumar um bico como complemento salarial para diminuir as dívidas do casal.

No começo, Marcone vendia kibe, kafta e outras iguarias árabes pra sair do vermelho, mas como a coisa apertou, ele aceitou um convite inusitado de um primo para trabalhar no ramo do entretenimento sexual.

A proposta era a seguinte. Como Marcone era uma cara avantajado, seria fácil oferecê-lo  a senhoras carentes em troca de alguns cobres. O público alvo seria cinquentonas gordinhas, destas de carne amolegada e dispostas a tudo por alguns minutos brincando com a anaconda de Marcone.

O negócio foi crescendo e  Zé Marcone acabou sendo requisitado para atender em outros cafundós. O foco agora eram as cidades do interior onde ele formaria uma clientela fiel e disposta a tudo por umas estocadas.

Marcone chegava nas cidades em cima da hora e ficava recluso no camarim das boates. Depois, surgia triunfal no palco metido em uma cueca de seda lilás  e um cap de guarda na cabeça. Em seguida, o assistente ligava as luzes e ele saia dançando o clássico I Surviver, com  um sortimento de mulheres com notas graúdas prontas para lhe prestigiar noite adentro .

A coisa pegava fogo durante a performance de Marcone, com a mulherada ao delírio gritando seu nome de guerra: “Guloseima, Guloseima”. O cara fazia maior sucesso.

Tempos depois, já com as contas em dia e satisfeito com a cartela de clientes conquistadas no Estado, Zé Marcone resolveu se aposentar da vida de casas noturnas, shows eróticos e deixou a segunda mulher.

Voltou à sua cidade natal disposto a mudar de vida e frequentar uma igreja pra expurgar os pecados do corpo e da alma.

No começo, as coisas iam de vento em popa: arrumou emprego, voltou aos bancos escolares e passou a procurar uma mulher honesta para se relacionar.  Mas bastou uma colega de sala convidá-lo para um baile na madrugada que Marcone pois tudo a perder. 

Diz a lenda que quando ele sente a força da lua no céu sai de casa com a obstinação de um bode atrás de cabra no cio.

A família já perdeu as esperanças de vê-lo sossegado e longe dos conflitos que abrasam o coração. Marcone vive por ai e convive com a angústia do conflito da carne. A última vez que soube de seu paradeiro tinha engatado um caso na região pantaneira. De lá, poucas notícias, há indícios de novas e devastadoras aventuras amorosas, mas essa história fica para o próximo capítulo.

Continua....