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O insustentável invenção do silêncio


Foi com grata surpresa que li os poemas do arquiteto Ângelo Marcos Vieira de Arruda, magistralmente ilustrados com a fina arte de Luiz Pedro Scalize, neste livro “A invenção do Silêncio” (que será lançado nesta terça-feira, na Morada dos Bais). A rigor, todo o trabalho editorial é um primor de bom gosto e apuro estético. 

Louvo o conjunto da obra pelo fato de tudo se encaixar numa harmonia repleta de delicadeza, em que as palavras e o desenho, plasmado num elegante contraste entre os traços cinza e o fundo branco, transcende a beleza do objeto e, além dele, funda a força do poema. 

A poética que comento aqui é apropriada dos conceitos Aristotélicos, em que as palavras são dissolvidas no ato da encenação estética para produzir não só beleza, mas acima de tudo prazer. 

Os poemas de Ângelo são singelos e engenhosos, produzidos por uma sensibilidade que enxerga no branco todas as possibilidades dialéticas que nossa mente desenha nos espaço. 

Nesse livro inaugural as palavras “invenção” e “silêncio” representam a ordem semântica que colocam em confronto movimento e repouso, criando um diacronismo próprio entre o ser e o tempo, no qual a palavra integra-se à vida, dando concretude ao belo, que se estende na direção das formas que estruturam o efêmero. 

Assim é a arquitetura quando veste a roupa insólita do poema. Assim é a palavra quando preenche o espaço dos sonhos com as impossibilidades do objeto.

A maioria dos poemas de a “Invenção do Silêncio” habita a esfera dos sentimentos confessionais, dos desejos abstratos, da imagem etérea que, no seu tour de force , faz aquilo que é essencial em toda literatura de proa: a sinceridade como modelo de expressão, infensa aos modismos, aos exibicionistas vanguardeiros e à diluição do significante como forma do autor se mostrar talentoso e genial. 

Todo poeta pedante é falso. Todo poeta arrogante manquitola seus defeitos em jogos rotos de palavra. 

Ângelo – numa combinação feliz com o talento indiscutível de Scalize –, ao contrário, faz da simplicidade a força de seus versos (às vezes densos, outras minimalistas) e cria seu próprio mundo: uma esfera do silêncio que cria formas, edifica sentimentos e constrói a essência de nossa alma. 




Instante-ser

todas
as
manhãs
me 
recomponho

dissolvo
num 

copo
amanhecer





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