Como reajustar salários em tempos de crise?
A recessão econômica vivida pelo Brasil colocará dentro em breve a sociedade num dilema crucial: como será possível reajustar salários nos patamares exigidos pelos trabalhadores do setor público e privado quando a escassez de recursos não é apenas mera abstração e sim um dado concreto da realidade?
Como se dizia antigamente, uma coisa é dever, outra é poder. No caso da iniciativa privada, dificilmente se poderá conceder reajustes generosos sem que as empresas tenham que fazer cortes de pessoal, fechamento de unidades de negócios, redução de atividade, aumentando o desemprego e a escassez geral.
Existe o caminho da redução das margens de lucro, dos juros e da carga tributária, mas essas são lentas, graduais e restritas pelo modelo contratualista brasileiro, que impõe altos custos à mão de obra e à burocracia pesada que a nossa legislação exige, incidindo de maneira deletéria sobre a produtividade.
No setor público, a situação é mais dramática porque governos acumulam terríveis déficits, os orçamentos estão mais do que espremidos e não há muita margem para o desenvolvimento de uma política fiscal que possa ampliar a base de arrecadação na proporção do aumento vegetativo da folha salarial.
Muitos vão dizer que o caminho será reduzir o tamanho da máquina, melhorar a eficiência administrativa, combater rigorosamente a corrupção, adiar gastos desnecessários e fazer um torniquete na boca do caixa.
É difícil - embora possível -, pois manter a governabilidade num sistema de tripartição de poderes significa grandes dificuldades de cortar privilégios ( principalmente dos poderes legislativo e judiciário), mesmo porque os "privilegiados" não tem percepção clara das dificuldades gerais da economia.
Quem tiver coragem de perguntar a um deputado, senador, juiz, desembargador ou procurador do MP sobre exageros salariais e benefícios indiretos ouvirá respostas típicas de quem certamente vive em Marte e não no planeta Terra.
"O Brasil já viveu muitas crises, saímos de todas elas, chegamos até aqui, não chegamos?", me dizem alguns desses senhores circunspectos, cheios de sabedoria.
Certamente, não estão olhando os índices de desigualdade, baixa qualidade dos serviços públicos, aumento da violência, precariedade das moradias, ressentimento das camadas médias e baixas. Eles não convivem diariamente com a ralé, habitando espaços típicos de quem vive na Alemanha.
Enfim, nosso olhar nos remete na direção da esperança de que o acúmulo de medidas impopulares adotadas no momento possam reverter o quadro das expectativas e dar o start para a volta lenta do crescimento da economia.
Mas a longo prazo todos estaremos mortos, lembrando Keynes.
Otimistas dirão que isso poderá começar a acontecer esse ano. Pessimistas acreditam que tudo vai piorar e que a sociedade viverá apenas as ilusões da esperança de dias melhores.
Fora Temer, gritam.
Sinto, contudo, que aos poucos as coisas começam a parar de piorar. Os espíritos parecem desarmados para discutir saídas que não são as melhores, mas são as possíveis. Alguns vão bufar. Mas acho que serão grupos minoritários. Mesmo assim, a crise não irá embora totalmente.
O Brasil está mergulhado em problemas éticos que tornam tudo muito mais complicado. Principalmente com aviões caindo com autoridades diversas.
Viveremos a próxima década um período de baixo crescimento, que exigirá alteração no nosso modo de vida. A palavra da moda talvez seja algo que gire em torno de desapego e menos ostentação. O chic será brega, o menos será mais.