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Terra em transe


O exercício do poder numa democracia é mediado pela formulação de contratos sociais permanentes que a sociedade faz com aqueles que representam suas instituições. Ontem no Congresso Nacional tivemos um exemplo dessa pactuação. 

Certamente, o resultado foi insatisfatório para aqueles que desejam extirpar com certa rapidez a chaga da corrupção. O mesmo não se pode dizer para aqueles que torcem para "estancar a sangria" da Lava Jato. 

A maioria dos deputados quer sobreviver ao processo de transformação que vem ocorrendo em todas as partes do mundo, buscando salvaguardas nas frinchas das leis que eles mesmos devem debater, alterar e aprovar. 

Ninguém em sã consciência fabrica a corda com que vai se enforcar.

Seria ingênuo demais imaginar que, por bondade e altruísmo, parlamentares tarimbados aceitem ir para o cadafalso sem dar no mínimo um berrinho de revolta ou fazer biquinho de contrariedade. 

Como nossos contratos sociais - estou sendo bem Rousseauniano aqui - visam sempre o bem maior, é de se esperar que o processo em tramitação, com seus pesos e contrapesos, sejam concluídos por um consenso em que todos saiam de certa maneira ganhando. 

Mesmo porque, o projeto da Lei Anticorrupção que foi aprovado ontem na Câmara dos Deputados - com todas as iniquidades aparentes e submersas - ainda traz algum avanço, devendo certamente ser melhorado no Senado e, em último caso, no Supremo Tribunal Federal (STF), dado que há ali farta matéria de direito constitucional em jogo. 

O mundo não vai acabar por causa disso. A natureza humana, de fato, tem suas perversidades e os nobres deputados fazem parte do mesmo barro com que fomos criados e formados. 

O parlamento brasileiro - como a totalidade dos parlamentos - padece de um retardamento na aprendizagem de transformações notáveis que galvanizam as sociedades, tentando resistir e manter a força do conservadorismo, independentemente de seus integrantes se situarem à esquerda ou à direita. 

Eles só entendem uma linguagem: a opinião pública organizada, seja lá o que isso signifique. Quando deputados, senadores, vereadores etc., começam a ficar com medo de circular alegremente pelas ruas, temendo ser reconhecidos e admoestados, aí eles começam a andar, ou melhor, a correr. 

Mesmo que seja contra si mesmos.