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Fantasmas, patrimonialismo e hipocrisia política


Sou daqueles que acreditam que todo movimento político - mesmo que seja o mais oportunista ou populista do mundo - gera uma energia no contra-eixo para melhorar as coisas. 

Nesse final de campanha, o deputado Marquinhos Trad foi amplamente questionado sobre suas relações funcionais com a Assembléia Legislativa, terminando o processo com um carimbo de "fantasma" na testa. 

No caso de haver uma segunda rodada ele terá a oportunidade de apresentar argumentos racionais e legais sobre qual é a verdade em torno desse assunto. Se vai ou não convencer, dependerá somente dele mesmo, mas em qualquer lugar do mundo onde prevalece o sentido utilitário de justiça, sempre é bom ouvir o lado do acusado. 

Reconheço que fim de campanha traz em si os elementos emotivos de um jogo que não se permite pensar direito. Tudo é ação e reação. 

Partidos políticos articulados com a candidatura governista armaram a ação - a denúncia feita por Athayde Nery, candidato do PPS - e o candidato atingido não conseguiu reagir de maneira que pudesse fornecer um argumento válido para seus apoiadores. 

Assim é a vida. 

Passada a refrega, seria lógico que a sociedade como um todo exigisse da Assembléia Legislativa, do Tribunal de Contas, do Ministério Público, do Poder Judiciário, do Executivo, das empresas autárquicas etc, etc, etc, a revelação ampla, geral e irrestrita dos "fantasmas" ou cargos em comissão existentes. (Não vejo relação entre ambas as coisas, mas a população enxerga a coisa assim).

Relatório completo deve vir à lume: nome, indicação, tempo de serviço, salário, tempo de contribuição para a aposentadoria etc, etc, etc.

E, por favor, não tentem me convencer que funcionários concursados estão livres de praticarem o nobre ato de assombração - pois transformar seu pequeno espaço dentro de uma repartição pública para fazer negócios privados - usando camada protetiva de exames concursais - é uma prática quase que centenária. 

O mundo é complicado. 

Por que o Brasil está vivendo essa merda toda? Alguém acha que isso é apenas obra de alguns e não uma longa corrente de transmissão de oportunismo, preguiça e lassidão ?

Ninguém poderá negar que o ectoplasma de muita gente - com relações de parentesco com o poder ou não - está presente no nosso dia a dia. 

Eu mesmo conheço dezenas de personagens que recebem bons salários no poder público em decorrência de relações familiares. 

Esse pessoal jamais é cobrado, trabalha quando tem vontade, enrola a não mais poder, enfim, fortalece o descumprimento com a coletividade, protegendo-se nas frinchas da lei para levar a vida numa boa. Mais: eles são temidos, intocáveis e tratados com reverência.

O patrimonialismo brasileiro não tem partido, ideologia, cor, gênero, raça - enfim, está enraizado na máquina do Estado ( às vezes na empresas privadas) porque nossa tradição é anti-meritocrática. 

Muito já escreveu sobre a cupinização do setor público. Quem sabe agora, quando isso acaba de se tornar tema relevante de campanha, possamos mergulhar fundo, contratando um tamanduá bandeira para acabar com essa farra

Seria, então, muito importante - aproveitando a deixa  - fazermos o aprofundamento verdadeiro do assunto. 

A Assembléia Legislativa devia trazer toda "essa verdade" à luz do sol. O Tribunal de Contas, idem. O Governo do Estado - esse é o maior estuário de nosso cupinzal - podia agora ser verdadeiramente transparente e mostrar todas as mazelas de sua cloaca.

A sociedade sul-mato-grossense seria grata.