Artigo da série Delírios da Província publicado em 1999 no extinto Jornal da Noite:
Você acaba de assistir “Clube da Luta” e está meio raivoso. Está doidinho para dar umas porradas no primeiro idiota que aparecer. Você ainda não entendeu direito quem é quem na história do filme: não sabe se Edward Norton é Brad Pitt ou vice-versa. Tudo bem: você também não tem muito certeza se é mesmo aquele sujeito que está pensando que é. Você só sabe que você é você mesmo porque antes de sair de casa olhou para o espelho e reconheceu aquela cara em algum lugar nas frinchas de sua memória fotográfica.
Você só sabe de uma coisa: quer dar porrada, quer sangrar, quer mandar tudo para o espaço.Está com raiva de tudo e todos. Mais ainda: quer lutar com o primeiro que passar pela frente e quer discutir se sobrou alguma alternativa original na sociedade de consumo que não seja a dor física.
Sim, é isso mesmo: você está vivendo a plenitude do Clube e acha que esse é um momento excelente para tomar um drink. Aonde ? Esse é o problema. Nossos bares são por demais pacíficos. De vez em quando um botinudo passa atirando a esmo e acerta alguém. Mas um bom corpo-a-corpo que é bom, neca de pitibiriba. Nos nossos bares faltam machos. Só tem florzinha, neguinho dócil.
Você então se aborrece. Quer de todo jeito brigar, dar socos, chutes, gravatas, golpes baixos. Sim, é isso mesmo: quer explodir tudo começando pela choperia ali da esquina. Você é Brad Pitt pensando que é o Edward Norton. Ou é o contrário? Sei lá, você está com raiva do mundo e o culpado foi quem inventou o cartão de crédito.
Você não se conforma com a calma noturna da avenida Afonso Pena. Acha que o tédio ainda vai nos afetar o cérebro. Faz um calor cão e não há nada que apague o fogo-fúria do seu inconformismo social. Acha que a saída é comprar um sabonete com cheiro de rosas na farmácia ali no centro. Mas pensa em como é feito o produto e resolve pensar que Brad Pitt é apenas uma imagem cerebral de Edward Norton. Caceta!!!