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Serra da Bodoquena: vale do salobra


Toda viagem é o encontro com nossas voragens. Até o cansaço do percurso produz sonhos estranhos.

Neste fim semana me embrenhei na serra da Bodoquena, hospedando-se numa chácara charmosa no fundo do vale onde corre as águas cristalinas do rio Salobra.

Éramos quatro pessoas compartilhando nada e tudo ao mesmo tempo. Não havia conversas amargas, não tínhamos compromissos a se cumprir, não tínhamos aonde ir.

Alí no vale tudo é manso, silencioso e solar. Não há internet, sinal de celular. E a TV por satélite torna-se desinteressante à medida que o tempo assume uma dimensão esquisita por causa do fuso-horário e dos intervalos "publicitários", que deixam a tela sem imagem por alguns minutos.

Os canais perdem o apelo e assim não pude acompanhar a tentativa de golpe na Turquia, o rescaldo do atentado em Nice, os escândalos no Brasil e assim por diante. Preferi a conversa à beira de um fogão à lenha com uma boa taça de vinho.

O lugar era no pé da serra. O rio cortava a paisagem a uns 50 metros adiante, numa descida íngreme, que era feita por uma escada sinuosa de pedra, que atravessava uma mata densa.

Olhávamos para o céu e sentíamos a portentosa Bodoquena a nos mostrar a nossa insignificância, com flores fechada, cheio de mistérios, e gritos de bugios. Longe, víamos contrafortes de arenito, sua magnitude esplendorosa, como um pequeno canyon, no qual desce uma fina cachoeira, nascida dentro da pedra ocre.

Tudo calmo, frio, num canto de mundo que deve permanecer como está, sem grandes hordas turísticas, apenas com aqueles viventes que compreendem que a beleza do mundo encontra-se num remanso de um pequeno rio, no cheiro verde de mato, no canto breve de um pássaro, no mugido de um boi e no balido de uma ovelha.

Tudo normal. Tudo como deve ser. Por pouco tempo.