Se eu fosse candidato nas próximas eleições, meu primeiro discurso de campanha seria o seguinte:
"Meus amigos e minhas amigas,
Vocês se lembram das palavras de Max Rockatanski no filme “Mad Max: Estrada da Fúria”, olhando para Charlize Theron, no momento crucial da história?
Não! Pois eu vos digo: “a esperança é um erro”.
Pois bem: eu digo a todos que não acreditem em minhas promessas. Não há esperança. Não há santos salvadores.
Ninguém salvará ninguém. Ninguém se interessará em resolver os problemas do povo.
Nossas palavras melodiosas sobre educação de qualidade, saúde eficiente, segurança pública que proporcione paz e tranqüilidade, gestão nota 10, honestidade e ética, são apenas uma maneira de mostrar que somos pessoas boazinhas, bem-intencionadas e que sonhamos com a felicidade geral.
Só que é tudo mentira. Somos egoístas e gananciosos. Somos enganadores até a medula. Somos cobras pestilentas nos preparando para dar o bote fatal numa presa inocente.
E a presa inocente é você, eleitor, o tonto que acredita em sorrisos amáveis, em interesses momentâneos, em tapinha nas costas, em palavras “sinceras”, em conversas idiotas pelas quais manifestamos interesse pela saúde da mãe, pela cirurgia de catarata da vovó, pelos problemas da irmãzinha, enfim, aquele papo que dá a impressão de que somos humanos e que trazemos em nossa vontade a vontade de ajudar o próximo.
Quanta vontade de rir. Quanta vontade de esconder atrás do palco, longe das luzes, e exclamar com o máximo de meus pulmões: como é fácil enganar gente otária! Como é fácil vender terreno na lua! Como é fácil prometer! Como gostamos de mentir!
Mentir, mentir, mentir: essa é a nossa verdade.
Olhamos para você, eleitor, com pena, às vezes com nojo, às vezes com enfado.
Você é apenas um número. Uma mão que precisamos cumprimentar. Alguém que precisa de atenção para contar seus dramas mesquinhos. Alguém que precisa ser atendido em seus pequenos interesses (um remédio, uma cadeira de rodas, um dinheirinho sujo...)
Digo sempre para meus assessores: precisamos ludibriar alguns milhares para conseguir os votos necessários que nos colocará no poder.
Por isso, façamos a contagem diária, isso é o mais importante. Sempre faça soma e multiplicação. Produzam relatórios diários mostrando quantos idiotas entraram para a nossa caixa mágica.
Depois disso, meu caro, se eu conseguir me eleger, o roteiro é simples: eu sumo nos labirintos dos gabinetes, ninguém consegue falar comigo por causas das reuniões infindáveis, troco de telefone toda a semana, minha secretária não dá o recado, e só espero encontrá-lo nas próximas eleições, quando novamente precisar de você.
É assim que fazemos. É assim que sempre vamos fazer. E o mais importante é que você não aprende. Você desiste com facilidade. Nosso tempo é gasto em articulações infindáveis, em mumunhas eternas, providenciando projetos para arrumar nossa vida e de nossa família. O resto, bem, o resto você sabe, mas esquece...
Nesse intervalo de tempo, só converso com empreiteiros, lobistas, empresários, porque esses sim conhecem os meus verdadeiros interesses e sabem como atender meus desejos.
De vez em quando ajudarei a promover eventos fajutos, falarei dos desterrados sobre a terra, apontarei os males das desigualdades sociais, prometerei o reino dos céus aos pobres e, pronto, missão cumprida, vou embora casa tomar meu uísque com minha amante mais recente.
Claro, de vez em quando, darei as caras em festinhas de aniversários e batizados, em cultos e missas dominicais, para mostrar essa proximidade necessária para quer todos imaginem estar sendo “prestigiados” (mesmo eu sabendo que, pelas costas, digam que sou canalha, corrupto e safado), pois é assim que somos nós brasileiros: cordiais na hipocrisia, falsos na celebração de nossa presença, dissimulados nas nossas relações sociais.
Digo a todos os meus companheiros: eleição é apenas um momento. É o momento de mostrar que somos mais espertos, mais cínicos, mais frios e pragmáticos.
Por todas essas razões, meus caros, votem em mim. Minha sinceridade vale seu voto. Vote em mim porque eu sou a realidade e os meus concorrentes são a fantasia paga por marqueteiros habilidosos.
Se eu vencer prometo apenas uma coisa: enganar, ludibriar, iludir.
Alguém poderia querer mais?.
Muito Obrigado."