Artigo publicado originalmente no jornal Correio do Estado:
Há uma grande expectativa por parte dos eleitores, dos pré-candidatos, dos dirigentes partidários, membros do Ministério Público Eleitoral e da própria Justiça Eleitoral, em relação às próximas eleições que ocorrerão neste ano para eleger prefeitos e vereadores em mais de 5500 municípios brasileiros.
Esse interesse ou incerteza sobre o que está por vir parece ser diretamente relacionado a pelo menos três fatores: (1) escassez de recursos: o país passa por uma das maiores crises financeiras dos últimos tempos, o que vai comprometer de modo decisivo as doações à candidatos e/ou partidos políticos; (2) crise política e ética: escândalos envolvendo a alta cúpula de partidos; afastamento da presidente da República e do presidente da Câmara dos Deputados; operações como a “Lavajato” que desvendou uma série de crimes praticados por agentes públicos e privados, comprometeram a credibilidade de autoridades e levaram o povo à total descrença em relação à classe política brasileira; e, por último, mas não menos importante, (3) a minirreforma eleitoral (Lei n. 13.165/2015), que trouxe inovações na legislação com a finalidade de reduzir custos das campanhas, equilibrar as oportunidades entre os candidatos e, ainda, dar maior transparência na arrecadação e aplicação de recursos nas campanhas eleitorais, como também efetividade à prestação de contas dos candidatos que, na visão do ministro Gilmar Mendes, presidente do TSE, deixará de ser uma peça de “faz de contas”.
Certamente, o Brasil deve - é o que se espera - inaugurar um novo modelo de campanha eleitoral, com menos recursos financeiros e mais propostas; com menos escândalos e mais debates qualificados em torno de ideias e projetos para a melhoria da vida dos brasileiros.
Em virtude das novas regras eleitorais e do endurecimento das penalidades aos “faltosos”, indubitavelmente, o que se verá (ou o que se espera ver) são candidatos se desdobrando para despertar a atenção do eleitor, com a finalidade de obter-lhe o voto.
A grande questão, entretanto, é saber como irão se comportar os candidatos diante desse novo cenário, pois, conforme afirmou W. A. Peterson, escritor americano que viveu no século passado, “a transformação pessoal requer substituição de velhos hábitos por novos”.
Caberá, em primeiro lugar, à sociedade brasileira cobrar dos candidatos a mudança que todos queremos, no sentido exato da importante afirmação do presidente do Conselho Federal da OAB, advogado Cláudio Lamachia, em artigo publicado no dia 01 de julho pp, no “Correio do Povo”, de Porto Alegre: “a sociedade brasileira precisa cultivar o hábito do debate político, especialmente em momentos como o atual, em que enfrentamos uma crise ética e moral sem precedentes na história deste país”.
A Ordem dos Advogados do Brasil, ciente de seu papel constitucional, tem contribuído de maneira decisiva para a transformação do processo eleitoral brasileiro e para o aprimoramento do debate político, sem dúvida.
Foi da OAB a iniciativa de propor no Supremo Tribunal Federal a ADI n. 4650, que acabou com o financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas , o que certamente irá contribuir para reduzir os conflitos entre os interesses públicos e privados.
E, neste momento, a Ordem está lançando em todo país, com o apoio das 27 Seccionais, o “Comitê de Combate ao Caixa 2”, cuja finalidade é orientar o eleitor brasileiro a respeito das práticas vedadas pela legislação eleitoral, servindo, da mesma forma, de canal de interlocução entre a sociedade e a Justiça Eleitoral, no encaminhamento de denúncias, esclarecimentos etc.
Mas isso tudo não basta e certamente não haverá transformação duradoura, se não ocorrer o efetivo engajamento de toda a sociedade brasileira no combate ao “Caixa 2”, pois é o eleitor o destinatário do candidato e, por isso mesmo, o personagem principal desse enredo eleitoral.
O Brasil atravessa um momento delicado na política e na economia, porém, de certa maneira isso tem contribuído para o amadurecimento das instituições e da própria sociedade; a verdadeira transformação – aquela que irá perdurar no tempo e consolidar o novo modelo de campanha eleitoral no Brasil, depende muito mais da substituição dos velhos hábitos por novos, do que realmente de reformas na legislação eleitoral.
Com a palavra, o eleitor!
Ary Raghiant Neto, advogado, membro do Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul, classe jurista, entre 2006 e 2012, Conselheiro Federal da OAB.