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Alexsandro Nogueira: O silêncio de Deus

 





Vivemos numa era de superexposição emocional e de promessas espirituais e prosperidade. Tudo parece possível: cura, dinheiro e plenitude. 

Até Deus virou um prestador de serviço, acessível por meio da oração e garantia de satisfação. Mas há momentos em que a fé colapsa. E o que sobra é o silêncio que não responde, não consola e muito menos, explica.

Já faz três anos que oro pelo mesmo pedido. Um só. Com paciência, com fé (quando tenho), com raiva (quando falta fé). 

Nesse tempo, não obtive resposta. Nada. E como se isso não bastasse, uma tragédia familiar atravessou meu caminho como um espada afiada. Dessas que tornam qualquer prece um exercício de sobrevivência.

Não sou ingênuo: sei que o mundo não gira ao redor dos meus desejos. Mas também não consigo crer nessa ideia infantil de que Deus nos avalia como um gerentão do universo, que distribui bênçãos ou castigos conforme critérios insondáveis. A lógica é incompreensível.

Se Deus atendesse a tudo o que pedimos, o mundo seria um caos, tal qual o filme “O dono do mundo” de Jim Carrey. E, convenhamos, muitos dos nossos pedidos são versões bem disfarçadas da nossa ignorância.

O escritor irlandês C.S. Lewis, dizia que a oração não muda Deus — muda quem ora. Talvez seja isso mesmo. Talvez o silêncio seja a resposta. Ou a ausência de resposta seja o único tipo de resposta possível quando se fala com a Trindade.

A questão é que não oro esperando milagres. Oro para me conectar com Deus e porque Jesus orava. Oro porque, no fundo, me recuso a aceitar que tudo isso aqui seja só ruído e acaso. A oração - pelo menos para mim - é uma rotina. Não é um gesto, uma repetição ou um ritual, mas uma forma de não me perder completamente de mim mesmo.

Ou como escreveu T.S Eliot, num de seus famosos poemas, talvez seja uma maneira de preencher "o vazio que o vazio inunda".

A dor não me tornou melhor. Não acredito nesse tipo de catequese do sofrimento. Mas ela me fez menos ingênuo, mais lento. Talvez, capaz de ver a beleza nos intervalos da vida.

A oração, para mim, não é blindagem, muito menos, varinha de condão para atender caprichos. É conexão. É um modo de chamar Deus para perto — ainda que Ele continue em silêncio. E se Ele continuar, tudo bem. Porque, paradoxalmente, é nesse silêncio que eu posso  aprender a ouvir.


Alexsandro Nogueira é músico, escritor e jornalista. Reside em Campo Grande