A primavera chega em 22 de setembro, mas não há qualquer canção que a anuncie. Saiu de moda, faz tempo, exaltar a estação das flores, como acontecia no passado, nas canções e também em poemas.
Lamento, mas reconheço que é difícil falar do assunto em tempos como os atuais.
Mas vou fazer uma tentativa, em homenagem à primavera. Pelo que estamos vendo, o romantismo está virando fumaça e fuligem. Triste.
Recordo com saudade dos dias em que Tim Maia cantou “é primavera, te amo (...)”. Naquela época, as flores não eram só um detalhe dentro de um vaso ornamentado; eram também símbolo de esperança e renovação. Tínhamos ainda as canções de Tom Jobim e Elis Regina, por exemplo, fazendo dela um verdadeiro palco de celebração.
Era um grito de alegria que contrastava com o Brasil cinzento da década de 1970.
Hoje, a primavera mal é notada entre a aridez do cotidiano e o frenesi da vida digital.
As flores (mesmo as de plástico) não têm mais aquele poder de antes – de suavizar as angústias. Há um oco, quase palpável, que se estende sobre as ruas, alamedas e almas aflitas, como se o brilho das pétalas cantadas por Djavan não fosse mais suficiente para iluminar corações e mentes.
A ironia é cruel: enquanto o mundo cria suas próprias dores e tempestades, a estação da esperança se tornou uma anomalia, um acaso esquecido.
A vida contemporânea, com suas metas e exigências, tirou de nós a capacidade de contemplação. O mês de setembro, que um dia encantou o compositor Beto Guedes, hoje se vê reduzido a um fragmento de nostalgia.
Na falta das canções que exaltam a primavera, a natureza continua imperturbável e serena. É um recado silencioso de que, apesar das sombras, ainda existe luz e a beleza persiste. Como disse Ernst Jünger, escritor e botânico alemão, em “Nos Penhascos de Mármore”, há uma lição sutil na persistência das flores. “Elas são o testemunho de que a primavera, de alguma forma, ainda consegue se manifestar, ainda que com um sopro em vez de um berro.”
Por ora, não vejo canções sobre o tema, mas que a beleza da estação, mesmo em seu minguado esplendor, nos lembre do valor do que é simples e verdadeiro. Que, mesmo sem o barulho das décadas passadas, possamos, ao menos, apreciar a inspiração de sua presença, como um sopro de renovação que nunca se esgota.