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Memória: voltando à República de Maracaju


Já recebi muitos pedidos de amigos e leitores para evitar confundir o município de Maracaju com o atual governo do Estado. Eles acham injusto para com a cidade e sua boa gente. O fato de o governador ter ali sua formação e seus negócios, ter sido prefeito, e feito da região sua base política, não deve corroborar referências debochadas. Essa é a crítica.

Primeiro, esclareço que a “Maracaju” a que refiro não é um local geográfico, um ponto no mapa, e sim uma mentalidade que se transformou no status quo governamental. 

Como muitos devem ter notado, a cúpula do atual Governo exerce o poder com arrogância peculiar: “se é nóis que afundou, é nóis que manda”, brincam moradores da cidade quando citam a frase preferida das famílias que se estabeleceram nos finais do século XIX na região da vacaria, fundando o coronelismo jeca conhecido em todo o Estado. 

Esse modo de ver o mundo domina as principais esferas do governo. Não se trata aqui de fulanizar essa observação porque, afinal, não é apenas Azambuja que emana esse espírito do tempo, mas um grupo de pessoas (muitas das quais nem são naturais de Maracaju) que acredita que o exercício da função pública deve favor a um tipo de mandonismo que está caindo em desuso em nossos dias. 

Vamos a um exemplo prático: ontem, o Mato Grosso do Sul foi novamente mostrado ao País, no jornal Nacional, como terra que deu origem ao modus operandi da JBS. Uma contribuição e tanto para a história brasileira. 

Essa máquina de operar propinas vem sendo alimentada de ganância e impunidade há mais de 13 anos. Não tem viés ideológico, não depende de sigla partidária, nunca foi obstada pelo Ministério Público Estadual nem pela egrégia magistratura do pedaço. Uma lindeza!

Como já havia adiantado há cerca de um mês aos meus leitores do Facebook, depois da denúncia do Fantástico, envolvendo a cúpula do governo do PSDB em MS, com a delação de Wesley Batista, logo conheceríamos a máquina de moer carne do Frigorífico Buriti. Essa é a ponta do iceberg. Vem mais rolo pela frente. 

O que muitos questionam é como o cidadão Reinaldo Azambuja, um homem sabidamente rico, entrou nessa esparrela. Responder a essa pergunta, certamente daria um tratado de psicopatologia humana. 

Se o personagem fosse mais sofisticado e complexo, talvez merecesse esse trabalho. Mas no fim tudo se resume a três palavrinhas: ambição, poder e burrice. 

Muita gente imaginou nas eleições passadas para o governo do Estado – e o candidato tucano reforçou essa ideia – de que ele era bem sucedido financeiramente e que, por esse motivo, “não precisava roubar”. 

Tempos depois, escrevi vários artigos dizendo que isso era uma mentira porque um homem de negócios será sempre um homem de negócios, dentro ou fora da política. O fato de ter dinheiro sobrando não significa que o sujeito foi imantado pela pureza moral por forças naturais. 

O fato é que minhas observações me custaram caro pessoalmente. Fui perseguido e processado. Me jogaram na vala comum de pessoas contrariadas com a fato de não ter tido uma boquinha no governo. 

Para minha sorte, a história foi outra: no primeiro ato de escolha da famosa “equipe de transição” percebi que tudo ia dar errado. Não se monta um “Governo Ético” com um bando de saqueadores, comandado por personagens como Sérgio de Paula e Ivanildo Miranda. 

Escrevi um artigo provocativo fazendo esse vaticínio. Fui advertido pelo ex-deputado federal Eurídio Bem Hur (“Você enlouqueceu! Esse pessoal é medieval! Tudo coronel de quinta categoria...eles vão te massacrar...”) e pelo ex-senador Ruben Figueiró (“Essa turma de Maracaju é atrasada demais para entender raciocínios sofisticados, eles vão te perseguir...”). Dito e feito. 

Hoje eu fico pensando: dou graças à minha intuição de criar um motivo para ficar longe do poder. Se eu tivesse me integrado à República de Maracaju seria o cara mais infeliz do mundo.