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Antonio Delfim Neto: Em defesa do STF


Artigo publicado originalmente na edição de hoje da Folha de S.Paulo:

O "annus luctus" de 2016 termina no pranto angustiado de uma histeria coletiva cuja energia dissipa-se na violência. Os limites factuais das "notícias" são extrapolados por análises frívolas que sempre terminam com um "sem dúvida nenhuma"... Como não têm dúvidas, sugerem tenebrosos complôs imaginários.

É impossível negar, por exemplo, que a disputa entre uma liminar idiossincrática de um membro do Supremo Tribunal Federal (STF) e o presidente do Senado, Renan Calheiros, envolveu exageros de ambas as partes, tanto quanto é impossível deduzir, superficialmente, que a ordem estabelecida pelo pleno foi produto de um "acordão" e, portanto, à custa de seus próprios princípios.

O voto que abriu a divergência e que, afinal, foi vencedor, é de uma clareza lógica meridiana: uma condição necessária para a sua recepção não estava satisfeita. O plenário corrigiu, ao mesmo tempo, um evidente abuso de autoridade do agente ativo e condenou o comportamento inadmissível do agente passivo, que vai responder por ele ao Ministério Público.

O Supremo Tribunal Federal mostrou o que é e o que deve ser: o guardião de nossas liberdades e o promotor da estabilidade institucional. Não foi por menos que a Constituição Federal de 1988 o sacralizou! Para que possa resistir "à voz das ruas" quando esta, em estado histérico, pede "vingança" em substituição à "justiça".

Aproveitemos o que resta do mandato presidencial de 2015-18 e ajudemos o governo que vai completá-lo na árdua tarefa de restabelecer a expectativa de que teremos relativo equilíbrio fiscal num horizonte visível.

Essa é a condição necessária, ainda que não suficiente, para o sucesso da missão não só do governo de Michel Temer, mas, também, do poder incumbente que elegeremos diretamente em 2018.

Os avanços das "reformas" propostas ao Congresso Nacional têm sido maiores do que se esperava e tudo indica que vão prosseguir, porque, a pouco e pouco, a sociedade toma consciência da trágica situação em que foi metida pela política voluntarista anterior.

Para 2017 preparam-se, em paralelo, medidas microeconômicas que atacarão os fatores inibidores do aumento da produtividade do trabalho e estimularão os investimentos privados em concessões de infraestrutura. A safra agrícola será melhor e a taxa de inflação deve aproximar-se da meta. Com isso, a taxa de juro real será menor e a taxa de câmbio real poderá ser mais estável num nível adequado para o setor industrial.

Há, portanto, esperança que se crie uma expectativa de crescimento. Sem ela nada acontecerá, nem mesmo o prometido equilíbrio fiscal.

Ex-ministro da Fazenda (governos Costa e Silva e Médici), é economista e ex-deputado federal. Professor catedrático na Universidade
de São Paulo.