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Alexsandro Nogueira: ódio aos podres de ricos

 



A parcela da sociedade contemporânea que se diz progressista, tolerante e plural engasga quando o assunto é riqueza. Nessa hora, a máscara cai.

O ódio aos mais ricos atravessa o espectro ideológico e dá um nó mental principalmente naquela esquerda que clama por redistribuição compulsória, sem contar que os liberais desprezam herdeiros e rentistas, ou seja, poucos ficam confortável com a ideia de que alguns têm muito enquanto outros mal sobrevivem seguindo a senda dos desvalidos do mundo.

Mas de onde vem esse ressentimento contra os bilionários de todos os tempos?

Helmut Schoeck, em ‘A Inveja: Uma Teoria da Sociedade’, nos oferece uma pista essencial. A inveja, segundo ele, não é apenas um sentimento individual, mas um fenômeno social capaz de moldar estruturas políticas e culturais. Se, em certas circunstâncias, ela funciona como um estímulo à competição e ao progresso, em outras, degenera em paralisia e destruição. 

O invejoso não deseja apenas possuir o que o outro tem; ele deseja, antes de tudo, que o outro perca o que possui.

Talvez eu esteja errado, mas problema com a riqueza é que ela escancara nossas limitações. O sucesso alheio se torna um espelho incômodo para nossas próprias escolhas, preguiças e incapacidades. 

Em vez de reconhecer a complexidade dos fatores que levam alguém ao topo – talento, disciplina, acaso, conexões, sorte –, o invejoso opta por uma explicação mais fácil: a riqueza do outro é ilegítima, fruto de injustiça ou exploração. É uma narrativa reconfortante, pois nos isenta da responsabilidade sobre nossa própria mediocridade.

Schoeck argumenta que sociedades mais bem-sucedidas são aquelas que aprendem a conter a inveja e transformá-la em motor de desenvolvimento. 

A inveja destrutiva, por outro lado, leva a políticas que não reduzem a pobreza, mas atacam a riqueza – como se empobrecer os ricos melhorasse a vida dos pobres. Nos lugares onde foi tentado degenerou-se em tirania, violência, fascismo e ditadura.

O resultado é previsível: quando a inveja dita a política, o crescimento econômico cede espaço ao ressentimento, e a igualdade se alcança pela miséria compartilhada, não pela ascensão coletiva.

A cultura contemporânea, com sua obsessão por justiça social e combate aos "privilégios", alimenta essa lógica perversa. Não se trata de corrigir desigualdades abusivas, mas de punir quem tem mais. 

No mundo digital, onde a ostentação é permanente e a comparação inevitável, a inveja se amplifica. 

Vemos o sucesso dos outros em tempo real e sentimos que estamos sempre perdendo. O algoritmo favorece o escárnio e a revolta, criando um ambiente em que a raiva contra os mais ricos se torna um vício coletivo.

 A culpa recai sobre o capitalismo, que pode ser imperfeito, mas que nos últimos 150 anos nos deu uma sociedade melhor do que outras do passado. Tente viver na Idade Média ou na Rússia do Imperador Nicolau e faça comparações estatísticas.

Paradoxalmente, os próprios ricos tentam se esconder. A ostentação sai de moda e dá lugar à hipocrisia performática. Bilionários juram lutar contra a desigualdade enquanto aumentam suas fortunas; celebridades fazem discursos contra o capitalismo de dentro de suas mansões. No fundo, todos sabem que o ressentimento contra os ricos não tem lógica, mas ninguém quer ser o alvo. 

O medo da inveja molda até mesmo o comportamento de quem deveria ignorá-la.

O problema não é a riqueza em si, mas nossa relação patológica com ela. 

Em vez de invejar os ricos, talvez fosse mais produtivo entender como a riqueza é criada e o que podemos fazer para melhorarmos de vida. Mas essa seria uma busca por respostas adultas – e o ódio aos ricos, no fundo, não passa de uma infantilidade bem disfarçada.




Alexsandro Nogueira, jornalista, escritor e músico