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Alexsandro Nogueira: Guarujá, um retrato do Brasil que se acostumou ao caos

  

Pedestres e ciclistas assistem à cena, assustados e, certamente, fazendo a pergunta óbvia: o que estamos fazendo no meio desses selvagens?


Existem imagens que constroem narrativas polêmicas, mas não ajudam a mudar a história. No último domingo (15), fui surpreendido por um vídeo que viralizou nas redes sociais: um homem, deitado no asfalto do bairro Pitangueiras, no centro de Guarujá - São Paulo, tenta se defender de dez meliantes agressivos e entusiasmados em lhe tirar a carteira, relógio e celular. 

Do outro lado da calçada, pedestres e ciclistas assistem à cena, assustados e, certamente, fazendo a pergunta óbvia: o que estamos fazendo no meio desses selvagens?

A notícia teve tratamento tímido da imprensa, mas a cena circulou pelo Brasil após ser publicada pelo perfil da Jovem Pan no Instagram, arrastando consigo os mesmos comentários previsíveis de sempre. 

Em poucos minutos, as redes sociais se transformaram em um campo de batalha ideológico: uns culpavam o presidente Lula, outros responsabilizavam o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. 

Há ainda aqueles, com um verniz de virtude, justificam tamanha barbaridade como falta de compaixão com os pobres. 

O que esses comentários revelam, contudo, é o que une os dois extremos ideológico brasileiros: a superficialidade. A essência abjeta de ambos os lados é a mesma — um discurso vazio que não propõe soluções, apenas alimenta o caos e faz mais barulho.

Há poucos dias, conversando com um motorista de aplicativo, ouvi um diagnóstico que vem das ruas, longe das análises políticas. “A vida piora a cada dia, no centro ou nos bairros. As pessoas estão mais agressivas, mais indiferentes”. E ele está certo. A violência, antes vista como um problema pontual, tornou-se parte estrutural do tecido social e faz parte da paisagem cotidiana. 

Hoje, o medo permeia as relações humanas, enquanto o senso de coletividade se dissolve na apatia. Tudo áspero e competitivo.

A polícia, frequentemente desaparelhada, faz o que pode, mas enfrenta desafios monumentais. Por outro lado, não podemos ignorar o peso ideológico sobre o debate da criminalidade. É inegável que setores da esquerda ainda romantizam o banditismo, utilizando a pobreza como justificativa para os delitos. 

A realidade, no entanto, é mais dura: ninguém rouba porque sente fome ou sede. A maioria dos crimes, especialmente os furtos, ocorre pela ausência de limites e pela falta de perspectiva de futuro. E, claro, há os que roubam simplesmente porque podem.

O episódio no Guarujá é mais do que um caso isolado — ele reflete a degradação da nossa sociedade. Perdemos a capacidade de indignação moral, e a violência, transmitida ao vivo pelas redes, transformou-se em espetáculo. 

Enquanto isso, os cidadãos de bem seguem com medo, reféns de um país que se acostumou a conviver com o absurdo.

Alexsandro Nogueira é escritor, jornalista e músico