Pages

Oráculos de MS deviam mudar de profissão


A derrocada das pitonisas arrogantes...

Em fevereiro deste ano, conversava numa roda de jornalistas e "especialistas" em cenários eleitorais de Mato Grosso do Sul e todos tinham uma certeza: o próximo governador do Estado seria André Puccinelli ou Marquinhos Trad.

Seria um ou outro, comentaram, lembrando que talvez Rose Modesto desse algum trabalho, podia ter alguma chance, mas tudo levava a crer o jogo estava jogado. Baixei a cabeça e me calei.

Na conversa, Lula já estava eleito, e Bolsonaro amargaria um terceiro e quarto lugar na disputa. Lembrei que ainda era cedo para esse prognóstico porque a caneta na mão às vezes faz milagres. Fui tratado como piadista.

Durante a discussão, lancei o nome de Riedel. Mais chacota. Uma colega fez ironias mordazes, e disse que Marquinhos e o governador Azambuja se tratavam como irmãos, e Riedel estava sendo citado aqui e ali apenas para cumprir tabela e esquentar a cadeira para a chegada de Trad no pódio.

Como tinha uma opinião divergente - aleguei que havia ainda muito tempo pela frente para cravar qualquer previsão muito precisa, preferi acompanhar a conversa calado, pois quem era eu na fila do pão diante de tanta gente inteligente e conhecedora das profundezas de nossa política.

Como fiquei abespinhado com aquela discussão, e em alguns momentos até me senti desrespeitado, decidi escrever um artigo ( leia aqui no Blog "A questão de Eduardo Riedel" , em 01 de fevereiro) demonstrando que a sua candidatura era pra valer e que seu perfil político o colocava como a grande novidade da atual eleição.

O texto provocou repercussão, embora muitos debochassem de meus argumentos.

Riedel pontuava nas pesquisas com 2%, era desconhecido, mal sabiam pronunciar seu nome, mas ele tinha um ativo: era um cara com excelente perfil gerencial, bom no trato pessoal, um liberal na economia, empresário de sucesso no agronegócio e com boa formação universitária. Ele reverteu o baixo astral do Governo de Azamba e o colocou como um dos melhores do País. Não é pouca coisa.

O tempo rodou. Ele se tornou candidato de Azambuja, teve imensas dificuldades para colocar seu nome na roda e começou a percorrer o Estado por onde ele mais conhecia: o setor produtivo. Ao fazer isso, teve gente que torceu o nariz. Achou que ele devia ir para a periferia, buscar as camadas mais vulneráveis e fazer pregação populista.

Nesse tempo, tive um ou dois encontros com Riedel - sempre reservados, em lanchonetes e restaurantes obscuros - e ele me explicou em detalhes sua estratégia, suas ideias e como superaria as dificuldades momentâneas. Naquele momento, me mostrou pesquisas e ele tinha em torno de 3 e 4% e nenhuma rejeição.

Como não sou marqueteiro muito menos "cientista político" achei seu plano razoável e disse que nos próximos dois meses (era abril) ele tinha que ultrapassar pelo menos 10% nas pesquisas, caso contrário, adeus candidatura.

Nesse meio tempo, a imprensa o transformou no "candidato que não decolava". Imaginei: se essa for a crítica, então as coisas estão indo bem, contrário do que pensava a maioria de sua equipe de campanha.

Argumentava que o jogo seria muito pesado e que o fato de não "decolar" era uma demonstração de que os adversários não estavam encontrando nada para atingi-lo.

Sustentei que isso era positivo. Abria espaço para a surpresa e o crescimento consistente.

No auge na ausência de "decolagem" Riedel pontuava entre 12 e 15%. Ou seja: ele pulava de 4 para 15%, mas o consenso político acreditava que a disputa seria entre Puccinelli e Marquinhos. Era um raciocínio errado, mas o que se vai fazer com as convicções humanas quando elas cegam e ensurdecem.

Foi quando estourou o escândalo do assédio sexual envolvendo o ex-prefeito e a coisa desandou, sem que os institutos e a mídia percebessem o que isso significava. "Isso não vai dar em nada; ninguém liga..."

O problema é que estamos em novos tempos. Mexeu com uma, mexeu com todas...lembram?

Puccinelli e Rose apostaram em campanhas silenciosas, sem inovações, flertando ora com um tempo em que grandes obras (e denúncias de corrupção) faziam a fama do político da hora. Rose batia na tecla do populismo, sem perceber que Mato Grosso do Sul engloba a grande faixa de prosperidade do País, onde seu discurso de assistencialismo tem um efeito muito fraco.

Enfim, no final, sobraram Riedel e Contar. E eu me lembro daquele conversa de fevereiro com um grupo de sábios prepotentes, cheios de certezas e nenhuma humildade.

Agora, faltando poucos dias para a escolha do governador, ainda não ouso cravar um nome, mas vejo um Capitão Contar enrolado com suas próprias contradições. A imagem construída em torno do sujeito ético, anticorrupção, defensor dos valores familiares, está vazando por todos os lados.

Fugiu de debates, mostra-se pouco articulado, perdeu o glamour bolsonarista, denúncias pululam em seu entorno. Sua esposa tem fama de rainha má, seu vice é apresentado como sujeito que passa a perna na própria família, a sede de campanha nos altos da Afonso Pena está envolta em total nebulosidade. O esgoto transborda.

E o mais grave: Contar não conhece o Estado, tem propostas pífias, sua palavra não tem valor de face, enfim, ele está perdido numa selva escura repleta de som e fúria, sem saber em quem confiar e o que fazer.

Além disso, permite que prospere uma boataria (acredito que seja meio absurda, mas vá lá...) no qual seu Governo, caso Contar seja eleito, será fatiado entre André Puccinelli, Júnior Mochi e Iara Diniz ( Marquinhos queria ser secretário de Saúde, mas foi limado), algo que está criando muita confusão no ambiente político.

Seja lá o que for, um processo eleitoral não é coisa para amadores. Uma semana é uma eternidade. E a previsão de especialistas, na verdade, é chute de gente estúpida que não sabe avaliar que o tempo muitas vezes modifica o espaço e vice-versa. Esse pessoal devia ler mais Santo Agostinha e menos livro de autoajuda.

Dante Filho