SEM MEDO DE IR PRO INFERNO. SEM ESPERANÇA DE IR PRO CÉU.
O purgatório pintava na minha cabeça como uma incômoda sala de espera, todo mundo de cueca, de acordo com o pudor da época, e eu encolhidinho a espera de saber se dali iria pro céu ou inferno.
Não sei se por deméritos meus ou por indução da igreja, o fato é que esse meu trecho criança ficou comprometido e não tem como repará-lo.
Minha evolução poderia ter sido mais produtiva se não tivessem enchido minha cabeça com as merdas que jogaram lá e com as culpas que me fizeram sentir.
Culpas são armas poderosas e inibidoras. Quantas vezes fui dormir com uma culpa enroscada na consciência por ter tido um pensamento sacaninha, coisinha de nada, tabus religiosos que era potencializados pelos padres e que nos faziam parecer criminosos seriais.
Vão pra puta que os pariu todos os que tornaram a minha infância um trem vagaroso, pesado e atrasado. Por causa deles demorei em pegar velocidade. Poderia ter sido uma cara inteligente, talvez um bom escritor, uma cabeça com maior raciocínio e melhor lógica.
Agora, passado tanto tempo de mal uso, tenho que me conformar em ser o que sou, esse traste que você lê, ou não. Hoje eu não quero mais ir pro céu, a não ser como caminho pra chegar em Paris.
Tirando o fato de achar que fui tungado na infância com essas baboseiras bíblicas, meu ateísmo foi um momento libertador gratificante.
Ele aconteceu como a luz que se acende depois de um longo período de escuridão. Alguém deixou a porta da prisão aberta e sai para descobrir o mundo sem conversa fiada ao sair dali.
Nada é mais libertador do que perder o medo de pensar a partir de você mesmo. Porque a gente nasce pensando com a cabeça dos outros, da experiência vivida por outros e não aquela que permite avaliar tudo por si mesmo.
Antes de ser ateu (ou seja o que isso signifique) eu era um covarde. Por me considerar culpado e sem saber do quê. Tinha a sensação que negar esse tal deus era o caminho mais curto para o inferno. Réu sumário. Eu, hein? Na verdade acatava a culpa por medo de confrontá-la.
O ateísmo é um ato de coragem, descobri, examinando meus achados de lucidez. Porque enquanto a maioria de vocês aceita a existência de deus, eu aqui, o babaca de plantão, nada de braçada nas águas da consciência tranquila. A tese é simples.
Se esse tal deus existir, como corre o boato, e ele for tão bom quanto dizem, não quererá se vingar de um ingênuo como eu, só pelo atrevimento de não acreditar nele. A não ser que deus seja vingativo. Se for, nao merece o que se fala dele.
Muitos dos que dizem acreditar, usam deus como o “puta merda” no banco do carona dos carros, precisam de algo onde se agarrar e essa é a sua opção. Não vou discutir essa opção, o “puta merda” dos carros pode ter ajudado