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Riedel é o governador que melhor encarna o ideal divisionista

  


FRASE:" Mas por que Riedel tem tudo para superar Pedrossian? Porque, por mais paradoxal que possa parecer, o próprio Pedrossian, do alto de sua soberba, foi o grande responsável para que o Mato Grosso do Sul já nascesse sob o signo da discórdia."


Por Valfrido Silva*
 
Quando o estado do Mato Grosso foi oficialmente dividido pelo presidente Ernesto Geisel, em 11 de outubro de 1977, para a criação do Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel era ainda criança, mas certamente que já ouvira contar as histórias de Pedro Pedrossian, o homem de Miranda, o grande governador que desbravara o Mato Grosso uno.

Cria de Filinto Müller, Pedrossian entrou para a política já na condição de governador do estado, feito histórico agora repetido por Riedel, cria de Reinaldo Azambuja.

Por suas realizações, enxergando à frente de seu tempo, no “novo colosso’ do Brasil, como era conhecido o MT, Pedrossian entrou para a história como mito. Quanto a isso, Riedel terá ainda que comer muito feijão, mas, até mais que Pedrossian, é o que melhor encarna o ideal divisionista de um estado que nasceu para melhor beneficiar de suas riquezas, depois de uma controvérsia histórica que durou mais de cem anos, até que fosse ouvido o brado separatista influenciado por fatores socioeconômicos e políticos.

Claro que Riedel pegou o bonde andando e seu governo é beneficiário de grandes projetos em andamento. Igualmente visionário, de perfil empreendedor, só pelo que tem para entregar neste começo de governo, como a rota bioceânica interligada ao modal ferroviário brasileiro que vai unir o Atlântico ao Pacífico, poderá subir ao pódio da história como o Pedrossian do novo século.

Para que isso aconteça o novato de agora só precisa estar atento para não incidir em erros políticos como os do próprio idolatrado e de todos os seus sucessores.

Criado por imposição do que hoje se chama de agronegócio, com apoio da classe política sempre ansiosa por mais espaço (de cara o ganho foi de três cadeiras no Senado e oito na Câmara Federal), o Mato Grosso do Sul ficou na poeira da estrada que leva às grandes lavouras de soja e algodão do Mato Grosso.

No mesmo ritmo a produção política por lá também foi bem mais expressiva que a de cá. Enquanto no velho Mato Grosso surgiu um Dante de Oliveira, ministro da Reforma Agrária, o homem das Diretas-já, pedra de toque do processo de redemocratização do Brasil e tantas outras lideranças de renome nacional, como rei da soja Blairo Maggi, os administradores do Mato Grosso do Sul sequer conseguiram selar o legado de Pedrossian, pois até mesmo a mais emblemática de suas obras, o Parque dos Poderes, continua um corpo sem cabeça, já que nenhum dos sucessores de Pedro entendeu, até hoje, como prioritária, a construção do Palácio do Governo, por ele deixado na prancheta.

Mas por que Riedel tem tudo para superar Pedrossian? Porque, por mais paradoxal que possa parecer, o próprio Pedrossian, do alto de sua soberba, foi o grande responsável para que o Mato Grosso do Sul já nascesse sob o signo da discórdia.

Inconformado por não ter conseguido ser o primeiro governador, por suas brigas com Antônio Mendes Canale (o prestígio do senador campo-grandense o credenciou a chantagear o presidente Geisel na escolha do primeiro governador), uma vez eleito primeiro senador do novo estado atropelou o primeiro governador nomeado, Harry Amorim Costa, impondo o prefeito de Campo Grande, Marcelo Miranda, por ele na sequência também derrubado, só aí assumindo o governo para um mandato-tampão, ao fim do qual teria sua segunda derrota, ao tentar fazer seu pupilo, o prefeito de Dourados, José Elias Moreira, seu sucessor. Derrotado em seguida por Wilson Barbosa Martins, com quem se revezaria no poder até que ambos se aposentassem na política.

Foi essa lambança de “dr. Pedro” que fez Mato Grosso do Sul patinar em seus primeiros trinta anos de existência no campo político-partidário.

Canale não foi a única vítima da vingança “pedrista”, seguindo-se as famílias Derzi/Coelho (aí incluídos o adversário derrotado da primeira eleição para o governo antes da divisão, Lúdio Coelho, seu irmão Italívio Coelho e o cunhado Rachid Saldanha Dérzi, todos senadores da República) e o não menos rancoroso Wilson Barbosa Martins.

Desse tronco, surgindo André Puccinelli e Reinaldo Azambuja e, consequência disso, até Zeca do PT virando governador. Na economia os descendentes dos fazendeiros que brigaram cerca de cem anos pela separação tiveram que contemplar, acima da divisa do rio Correntes, que separa os dois estados, cada vez mais o novo colosso a se agigantar.

Agora, cabe a Eduardo Riedel fazer valer o seu já batido discurso da transversalidade. Se isso valer também para o jeito de fazer política – e ele tem sinalizado que não será apenas um poste fincado na invernada do fazendeiro e coronel da política Reinaldo Azambuja – e, mais, sem o espírito revanchista que maculou a biografia de Pedro Pedrossian é, sim, entre todos os governadores do ainda ‘novo’ estado, o que mais encarna o espírito divisionista.

Divisionista, digo, no sentido de independência, que levou Vespasiano Martins (prefeito de Campo Grande, governador e senador) à primeira tentativa de criação de um novo estado, nos anos 1930, quando Campo Grande foi pela primeira vez capital do estado de Maracaju.



· Jornalista. Artigo publicado originalmente no blog ContrapontoMS (Dourados MS)